Série II.005
Savoy
O Plano de Urbanização do Infante foi aprovado em meados de 2007, altura em que governava a cidade do Funchal, Miguel Albuquerque, atual presidente do Governo Regional.
À semelhança de outros desastres urbanísticos que aconteceram durante o seu consulado, onde a quase totalidade de Planos de Urbanização e de Pormenor foram pensados e aprovados para dar cobertura a uma série de irregularidades, este caso do Savoy terá sido provavelmente o Plano mais ‘martelado’ que reza a história do Funchal.
Para terem uma ideia, a área de intervenção deste plano abrange várias classes de espaço. A sua classificação vai desde Zonas Turísticas de Alta Densidade (que, por artes e ofícios, deixou a partir de certa altura de ter índice e passou a contar a integração na volumetria dominante), onde se insere a área do Hotel Savoy, até à Zona Verde Urbana de Recreio e Lazer como o parque de Santa Catarina, que praticamente não teria qualquer capacidade construtiva (ICB=0,1) para além de pequenas e eventuais construções de apoio ao parque.
Ora como é que a Câmara Criativa de Miguel Albuquerque consegue dar “sustentabilidade” às pretensões do Promotor do novo Savoy?
A “engenharia” mirabolante e inventiva da equipa de Miguel Albuquerque, considerava que os Planos de grau inferior ao PDM, como seja os Planos de Urbanização e de Pormenor, servem para obliterar as estratégias e regras definidas em Plano Director Municipal e fazer o lhe desse na real gana, sobretudo se houvesse um promotor interessado em ‘dinamizar a cidade e criar muitos postos de trabalho’.
No entanto, quem tem a noção mínima para que servem os instrumentos de ordenamento e planeamento do território, percebe facilmente que os planos grau inferior servem para detalhar as estratégias e regras definidas acima e, eventualmente, corrigir ligeiramente situações, sobretudo em zonas de fronteira entre classes de espaço diferentes.
Contudo, a “engenharia criativa” teve a “brilhante” ideia de atribuir um índice à zona de intervenção superior ao que estava definido no PDM e, a seguir arrebanhou, o Parque de Santa Catarina para dentro do perímetro do PUInfante que passou logo a ter um índice superior igual ao restante.
Como se isto não bastasse, uma vez que a maior parte dos terrenos já estão consolidados e no parque de Santa Catarina não está previsto a construção de qualquer edifício, através da perequação definida no PU, estes pequenos proprietários e a Santa Catarina, ‘trocam’ índice com o terreno do Savoy para este poder ter ainda mais índice.
O terreno do Savoy acaba por ficar com índice 3,05 ou seja com mais do dobro permitido pelo PDM.
Relativamente à altura e número de pisos do novo Savoy, não me recordo de ter havido qualquer criatividade para suportar tal enormidade. Foi mesmo à bruta e sem qualquer justificação desrespeitando também o próprio PDM, já revogado, que diz na alínea a) no aditamento ao 15ºart que ‘’a volumetria dos edifícios deve integrar-se na volumetria dominante da área em que se localizam, não podendo constituir elemento dissonante e destacado’’.
A propósito de justificação clara e coerente para estas alterações poderem acontecer, é coisa que não existe no Relatório do Plano de Urbanização do Infante que, inicialmente, teve o descaramento de se chamar Plano do Savoy.
Houve esperança, durante alguns anos, desde que o arranque da obra parou, não só que o PUInfante fosse reconsiderado, como as próprias aspirações do promotor do novo hotel Savoy tivessem o bom senso de reenquadrar o seu produto na sua envolvente, não só em termos de índice de ocupação e volumetria, como também na morfologia que a cidade apresenta naquela zona.
Tive até a esperança que a nova Câmara tomasse as diligências necessárias para endireitar o que torto tinha nascido. Mas parece que não e em breve, teremos então o arranque da obra que constituirá mais um abcesso nesta bela cidade do Funchal.
De um lado da avenida, uma correnteza de casas com dois pisos dos anos 40, condicionadas pela obrigatoriedade da sua preservação. Do lado oposto uma muralha de mais de 50 metros de altura com cerca de 16 pisos. Esta semente, deixada por Albuquerque será, a par de outras como o Funchal Centrum, das piores alarvidades que se terão feito no princípio deste século aqui no Funchal.
Ah pois! Os postos trabalho! Bem, talvez pudéssemos começar a pensar que também é possível criar postos de trabalho com investimentos de qualidade, enquadrados no seu Lugar e inseridos numa melhor estratégia para o Turismo da Madeira.
Estratégia?
Turismo?
Pois, na realidade também ninguém sabe exatamente se há alguma estratégia para o Turismo e se calhar, até este monstro que vai crescer na Av. do Infante estará enquadrado nessa estratégia, que talvez exista, mas ninguém conhece.
15 de Dezembro de 2015
publicado in JM . Jornal da Madeira