Houve tempos em que as cartas, as proclamações, os manifestos, os jornais, as cartas, tinham a sua importância. Palavras ditas da boca para fora constroem atoardas, criam boatos e alimentam coscuvilhices, ‘bilhardices’. Porém, se elas ficarem preto no branco, comprometem. A palavra escrita é aquela que fica. É ela que liberta, mas é também aquela que compromete.
Contudo, aos poucos, a palavra tem vindo a desaparecer. Quase sem nos apercebermos, as cartas deram lugar aos SMS’s, enquanto o jornalismo foi dando lugar ao comentarismo. Dos blogues, daqueles que continham ideias e debates, passou-se para o facebook, para as frases curtas, comentários extemporâneos e bujardas anónimas que o mundo cibernético permite com facilidade. Mas, até isso…até isso, é preferível à vertigem da imagem. Hoje impera a cultura ‘instagramica’. Uma imagem com duas ou três palavras quanto muito, uns filtros para ‘pintarem‘ a coisa bonita e, ideias… zero.
Quando a expressão política também se resume apenas a uma imagem, com uma frase que serve de legenda, quando a política se esvazia de ideias e é substituída por uma colagem de frases feitas, acompanhadas de imagens bonitas… então é sinal que batemos no fundo.
Quando isto acontece, ou os políticos pretendem, objetivamente, lobotomizar lentamente a sociedade, ou os cidadãos não estão minimamente interessados em discutir nada. Ou, então, não há ideias para colocar à discussão e por isso tiram-se fotografias, fazem-se inaugurações e debitam-se discursos redondos, feitos de frases de catálogo.
Quando estas três situações acontecem ao mesmo tempo, temos um problema. E o problema chama-se populismo. Esse populismo, não raras vezes, acaba mal. Ou numa degeneração democrática que dá lugar à demagogia, ou num condicionamento despótico sobre uma população que sucumbiu à miragem prometida do demagogo messiânico.
Jardim assim fez. Surfando os euros que jorravam da Europa e o perdão de dívidas incontroláveis, cavando buracos orçamentais para semear betão e alimentar ervas daninhas, à custa de um populismo que saciava as necessidades de uma região empobrecida na sua ultraperiferia, dando lugar a um modelo de desenvolvimento insustentável que buscou inspiração noutros lugares turísticos que nada tinham a ver com esta pérola no Atlântico. Porém e apesar da escolha de um modelo fácil de conduzir, mesmo por alguém sem carta de condução, houve uma ideia qualquer de desenvolvimento, ainda que insustentável e desadequada a este território.
Mas hoje, até as ideias parecem ter saído do debate político.
Contra esse caminho que aqui nos trouxe, o projeto que o PS Madeira iniciou em 2015 com Carlos Pereira, tinha por base um modelo de desenvolvimento alternativo para a Madeira. Havia ideias por detrás desse projeto. Mas esse projeto foi interrompido. Em vez da verdade e credibilidade de Carlos Pereira, ganhou um futuro pelas pessoas de Emanuel Câmara. Assim quiseram 57% dos filiados no PS da Madeira.
Falta agora saber como o novo presidente vai liderar um partido que disputou dois caminhos diferentes e que pontes vai construir para os unir. Aliás, a única forma do PS se apresentar uno e capaz de liderar um projeto com um rumo diferente daquele que, até agora, tem sido escolhido para a Madeira. Falta ainda saber que ideias poderão construir essa alternativa a um PSD que, agora se começa a perceber, estar a reconstruir uma unidade em torno de uma deriva neo-jardinista, no discurso e na forma.
Façamos então um esforço para regressar à palavra, às ideias, às estratégias, aos debates e à cidadania. Só assim se poderá fazer a diferença e a mudança.
26 de Fevereiro de 2018
publicado inJM . Jornal da Madeira