Novos voos

Série II.001

Novos Voos

O último voo registado foi o n.64 e data de 27 de Maio de 2009, na altura em que dispunha do espaço aéreo cedido pelo DN Madeira. Agora, em virtude de uma abertura do espaço do JM, retirei o aeroplano do hangar e aqui estamos prontos para uma nova série de voos.

Para elaborar o plano deste voo, folheei alguns anteriores. Tem voos críticos, voos políticos, voos suaves, voos picados, voos de principiante, algumas acrobacias mais arrojadas, voos de cruzeiro, voos de bombardeiro, mas quase todos eles versam sobre os temas que me são mais caros: a arquitectura, a paisagem, a cidade. E é esse rumo que aqui retomarei.

​Dos “voos” que começaram em 2003 e acabaram em 2009, destacam-se sobretudo aqueles que falam sobre a necessidade de haver uma cultura de planeamento do território, de desenho urbano e uma atenção especial sobre o património e a preservação dos elementos e características que constroem o “genius loci”.

Muitos daqueles textos foram escritos numa altura em que a paisagem das ilhas da Madeira e Porto Santo estava pejada de gruas, de brocas gigantes e tetrápodes prontos a entrar pelo mar a dentro.

Em curso estava um desenvolvimento sustentado (pelo dinheiro dos outros) e insustentável (como se pode constatar) e era suportado por uma visão de Alberto João Jardim sobre o planeamento do território patente em programas de governo como o de 2005-2009: “Concluídos os planos de ordenamento do território (…), (PDM’s, POOC’s(?!), POT), interessa garantir a sua aplicação (…) pelas instituições públicas e pelos privados, (…) potenciando o desenvolvimento sustentado e equilibrado dos espaços rurais e urbanos, mas sem a rigidez planificadora das sociedades socialistas e estatizadas.”

Ora, só por esta frase dá para perceber o desnorte que foi o planeamento nos últimos 40 anos na Região, onde se confundia o planeamento económico e a planificação financeira, com o planeamento do território e a planificação urbana. O resultado está à vista: uma paisagem rural descaracterizada; a obliteração de património e elementos que davam identidade à paisagem e aos lugares; a criação de zonas de expansão caóticas; uma errada noção de descentralização que deu origem a dezenas de infra-estruturas que agora estão às moscas, etc.

O Programa do novo Governo de Miguel Albuquerque, não contendo grandes ideias sobre o Ordenamento do Território, não enferma, apesar de tudo, de tamanhos dislates.

Poderíamos por isso ter a esperança que as coisas vão correr melhor, não fosse o caso do novo Presidente e outros membros do Governos terem sido coniventes com as políticas de AJJ, cúmplices de decisões políticas pretéritas e responsáveis por graves atentados urbanísticos à margem da Lei.

Quando ouço a palavra “renovação”, quando se refere a este novo Governo, só me lembro das entrevistas de Baptista Bastos onde ele perguntava aos seus convidados ‘onde é que estavas no dia 25 de Abril?’. Por isso dá-me vontade de perguntar a cada membro desta ‘renovação’, ‘onde é que você estava antes do dia 29 de Março de 2015? Ainda assim aqui fica o benefício da dúvida.

15 de Julho de 2015
publicado in JM . Jornal da Madeira

Desenvolvimento Sustentável

Série I.001

Desenvolvimento Sustentável

Nos anos 60, tratavam-se apenas de ideias de pequenos grupos apelidados de sonhadores, utópicos ou loucos. Hoje são ideias apregoadas nos discursos dos governantes e é politicamente correcto utilizar essa palavra no discurso social: AMBIENTE.

Ambiente, Ecologia, Desenvolvimento Sustentável, são palavras que estão na moda, embora a sua prática esteja muitas vezes àquem do desejável.

Sabendo hoje que, à velocidade com que temos consumido os recursos naturais, desenvolvemos urbes desorganizadas e macrocéfalas e criamos desequilíbrios sociais e económicos, não vamos muito mais longe, parece começar a mudar aos poucos a ideia que se tinha de Progresso. Hoje o significado desta palavra começa a estar desligado do betão e do aço, dos arranha-céus, do transporte individual, do consumismo desenfreado e da utilização aleatória dos recursos que a natureza nos oferece.

É assim urgente reflectir sobre a forma como estamos a ocupar e utilizar o território e sobre a eficácia dos modelos económicos e sociais adoptados. É esta reflexão que propõe, em termos gerais, a Agenda Local 21. Este documento, ou plano, que saiu da primeira conferência mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, no Rio de Janeiro, em 1992, identifica os problemas e as mutações que as sociedades do século XX sofreram com a migração para as cidades e salienta a vulnerabilidade do meio ambiente. A Agenda 21 denuncia o desequilíbrio existente entre os 3 principais vectores de desenvolvimento: o económico, o ecológico e o social ou comunitário. A ideia essencial é pensar de uma forma global, sem esquecer o que nos rodeia, e agir localmente.

É localmente que se podem fazer as grandes apostas, pois é aqui que as populações podem interagir e discutir o seu futuro de uma forma mais directa.

No entanto é preciso utilizar outras fórmulas distintas das actuais, pois a maneira como o sistema democrático está implementado ao nível autárquico, tem levado à destruição da paisagem rural, ao desenvolvimento caótico das cidades e à degradação da qualidade da vida urbana. O sistema de rotatividade de um projecto politico, de 4 em 4 anos, é muito limitativo para o que uma cidade realmente precisa. Daí que se aponte para a criação de Planos Estratégicos que dêem um rumo ao desenvolvimento de cada cidade. Assim, talvez se possa passar ao lado do caricato espectáculo das inaugurações antes das eleições e não se deixar apenas à mercê do poder económico o destino da cidade mas tendo em conta os outros vectores de desenvolvimento.

O Desenvolvimento Sustentável de uma comunidade depende do equilíbrio entre estes 3 vectores e para que ele exista, é necessário envolver na elaboração de um Plano Estratégico todo o cidadão, através das várias associações comerciais, industriais, profissionais, ambientalistas etc, em que a Câmara tomaria, principalmente, o papel de maestro. Esta é, não só uma forma de encontrar soluções em conjunto, mas também de responsabilizar cada um dos parceiros por cada direcção apontada. É a maneira inteligente de traçar um rumo para a cidade. E quando se fala em rumo para uma cidade fala-se nas grandes linhas que há a traçar em relação à actuação nos Centros Históricos, ao Património edificado, às Novas Centralidades, à qualidade dos Espaços Públicos, à Ecologia urbana, aos sistemas de Mobilidade, à criação e localização dos equipamentos públicos e, sobretudo, na definição e exponenciar das qualidades que poderão tornar cada cidade num lugar onde dê gosto viver e seja interessante visitar.

Funchal, 17 de Janeiro de 2003
publicado in Diário de Notícias da Madeira

Sobre a Arquitectura e a atividade profissional do Arquietecto

A Arquitectura é com a Música, a Pintura, a Escultura, a Literatura, a arte representativa (teatro etc.) uma das 6 artes maiores. Ela é arte mas também técnica. A técnica do saber da construção.

É por isso a fusão desses dois predicados: É a arte e a técnica de desenhar edifícios que, de alguma forma, expressem valores estéticos mas também utilitários, que sigam a função para o qual foram desenhados como Habitar, Trabalhar, Lazer, etc., mas também que sejam a expressão estética do seu tempo.

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Vias de Comunicação

Série I.002

Vias de Comunicação

É indiscutível a importância das Vias de Comunicação no desenvolvimento das Regiões. A circulação mais rápida e confortável de bens e pessoas e o acesso mais fácil, nos dois sentidos, a determinados serviços, pode levar ao progresso de zonas, que antes se situavam numa posição periférica, em relação aos grandes centros de desenvolvimento.

O seu traçado deveria pois ser projectado, tendo em conta factores secundários que não se prendem apenas com a ligação mais rápida entre dois pontos: O desenho dessas vias deverá ter em conta a sua integração na paisagem, como estruturas de grande impacto que são e a sua construção deverá ter também preocupações estéticas e de qualidade, ultrapassando a satisfação mais básica e funcional.

Há ainda outro factor, mais importante e problemático, que estes atrás referidos. É notório que os sítios, outrora mais remotos, uma vez servidos por acessos rápidos, se tornam em lugares apetitosos para se transformarem em satélites habitacionais e de serviços dos grandes centros urbanos.

Assiste-se então a um movimento especulativo dos solos e ao crescimento destes sítios, surgindo assim duas hipóteses. Na 1ª, e mais recorrente no nosso país, o crescimento é feito de uma forma desordenada, ao sabor das necessidades do poder económico e da procura pouco exigente do mercado; na 2ª hipótese a projectação das novas vias de comunicação fará parte de um Projecto Global que inclui também o Planeamento Urbanistico dos lugares servidos por essas vias, além de outros estudos sobre o impacte que essas localidade vão sofrer.

Logo à partida parece óbvio que a 2ª proporciona sítios de maior qualidade urbana, com equipamentos e espaços públicos qualificados e com edifícios que, relacionados entre si e obdecendo a regras lógicas, constroem cidade (civitas). No primeiro caso, que é o que tem acontecido na Madeira à semelhança da maior parte do país, o crescimento desordenado e quase sem regras, dá lugar a sítios caóticos, quase sem zonas verdes e de lazer, onde os edifícios, ainda que em zonas urbanas, têm uma relação rural com o espaço público e que este se limita a uma rua onde circulam automóveis, com um passeio de 1,20m. Assim não se faz cidade (ainda que tenham esse estatuto administrativo), constrói-se um aglomerado de edificações.

E porque é este factor o mais importante desta problemática? É que os erros urbanísticos não se corrigem por si só nem nos próximos cem anos e ao fazê-lo antes, custará ao erário público quantias astronómicas.

É importante, por isto, que numa época em que os discursos politicos reclamam qualidade, se deixe de agir de acordo com a “Politica do Betão” e se comece a planear o território antes de actuar. É que há formas mais inteligentes de Progresso e há que começar a pensar em Desenvolvimento Sustentável e não em Desenvolvimento Sustentado.

Funchal, 17 de Fevreiro de 2003
publicado in Diário de Notícias da Madeira