Nova Agenda Urbana para o Séc.XXI

Série II.015

Nova Agenda Urbana para o Séc.XXI*

A habitação, ou o lar, é, desde sempre e na maior parte da civilização sedentária, não só o abrigo, mas também o centro da vida familiar.

​E se entendermos a família como um elemento estruturante da nossa sociedade, então podemos construir um silogismo onde, para termos uma sociedade bem estruturada e equilibrada, para além de outros fatores, é fundamental que a sociedade garanta, por diversos meios, que todos os cidadãos tenham acesso a uma habitação de dimensão adequada e em condições de higiene e conforto, como diz a nossa Constituição.

Nos últimos 40 anos, Portugal desenvolveu um esforço significativo por fazer valer o artigo 65ª da nossa Constituição. Através do Programas Especiais de Realojamento, contribuiu para a erradicação de conjuntos de habitação de construção informal, ou barracas e através de programas como SAAL e outros que surgiram mais tarde, conseguiu proporcionar habitação para classes sociais menos favorecidas.

​Hoje, poderíamos dizer que a paisagem urbana, já não é ferida visualmente pelos bairros de barracas que cresceram, junto aos grandes núcleos urbanos. Mas isso não quer dizer que que não haja uma parte da população, no nosso País, ainda a viver em condições que não cumprem o mínimo para os padrões europeus de habitação condigna.

​Existem, ainda hoje, listas para o acesso a habitação social; Existem, hoje, cidadãos sem-abrigo que necessitam de soluções distintas; Existem, pessoas e famílias, a viver em habitações sem condições de habitabilidade e salubridade.

​Estamos por isso conscientes que é necessário ir além de um conjunto de programas municipais que tentam colmatar situações pontuais e locais. Seria, pois, desejável, reescrever uma política de habitação que, de alguma forma, resolvesse essa incongruência que é ter um País com milhares de fogos devolutos e, por outro lado, famílias carentes por uma habitação condigna. É necessário desenvolver uma estratégia que tenha em conta esses dois fatores.

Entretanto, há boas novas nas políticas de cidade e que constam no Programa de Governo, nas Grandes Opções do Plano e no Programa Nacional de Reformas.

​Indo ao encontro do que é consensual, a nível europeu para países com o nosso grau de desenvolvimento, é um objetivo conter a expansão dos núcleos urbanos e proceder à regeneração dos mesmos, através da requalificação do edificado e renovação do espaço público.

​Tendo por base este paradigma, o estado pretende, através do fundo de Reabilitação do Edificado, recuperar uma série de edifícios abandonados e introduzi-los no mercado de arrendamento, garantir uma parte para renda acessível e para jovens, e também incrementar uma politica urbana de requalificação do espaço público como motor de arranque para a requalificação do edificado envolvente, a par de outras intervenções no âmbito do Prohabita e outros programas que têm como objetivo garantir o desenvolvimento da sociedade em meio urbano, de uma forma sustentável, com qualidade de vida para os cidadãos e construindo hoje o património que um dia mais tarde será valorizado pelas gerações vindouras.

Do documento produzido pelas Nações Unidas para a Habitação e Desenvolvimento Urbano Sustentável, podemos retirar vários objetivos que se pretendem alcançar com a Nova Agenda Urbana. Mas a maior parte já faz parte da maior parte das agendas políticas do nosso País.

​Contudo há alguns que retive da sua leitura e que agora ganham outra importância.

  1. As políticas de cidade devem ter como um dos objetivos a erradicação da pobreza, a inclusão, a coesão social, num ambiente multiculturalista, garantindo equidade a todos os cidadãos.
  2. A cultura e a diversidade cultural são fontes de enriquecimento para a sociedade.
  3. Novos padrões de consumo e de produção sustentável, devem ser tidos em conta e que isso, possa contribuir para um abrandamento e até retrocesso nas alterações climáticas no planeta.
  4. Os hábitos de mobilidade e o uso do transporte público devem merecer um maior esforço das entidades públicas para a sua implementação e da nossa parte para a sua utilização.
  5. A participação cívica e a transparência nos processos de decisão são essenciais para a transformação da cidade e da paisagem.
  6. E há um dos compromissos que me é muito caro, porque o tenho vindo a propagandear há muito tempo, que está inscrito na Nova Agenda Urbana e que diz, que a organização espacial, a acessibilidade e a conceção do espaço urbano, bem como a criação de infraestruturas e serviços básicos em conjunto com as politicas de desenvolvimento, podem promover ou dificultar a coesão social, a igualdade e a inclusão.

Ou seja, não é necessário apenas construir habitação, é preciso fazer cidade, pensando nos espaços públicos, na mobilidade e na qualidade dos equipamentos.

​O progresso da Humanidade fez-se nas cidades. ‘Civitas’, o modelo da cidade clássica, influenciou o mundo, proporcionando a troca. A troca de é base do sucesso das cidades e a razão do desenvolvimento e do progresso – a troca de ideias, de bens e do conhecimento. Pois é do confronto de ideias que saem as grandes opções políticas, é a troca de bens que move a economia e é a troca do saber e do conhecimento que valorizam e influenciam a cultura de um povo.

Devemos por isso cuidar bem das nossas cidades para podermos cuidar bem de nós.

13 de Dezembro de 2016
publicado in JM . Jornal da Madeira

* Intervenção proferida no debate público sobre a conclusões da conferência Habitat III – Quito, Outubro de 2016 e a Nova Agenda Urbana para o Século XXI

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