Dubaibai Madeira

A Madeira já quis ser Canárias, a Madeira já quis ser Singapura, a Madeira já quis ser outras tantas coisas e agora, pelos vistos, … quer ser Dubai. A Madeira vai sendo aquilo que os promotores imobiliários vão querendo que seja. O poder político, aquele que deveria defender o interesse público, anda a reboque como sempre andou.

‘’Ó Sr. Azevedo, você quer construir um centro comercial assim grande? Sim, pode ser aí no meio das bananeiras, nós depois fazemos as infraestruturas para os seus clientes lá chegarem? (…) PDM?! Isso logo se vê. Faça, faça!’.
‘’Ó Sr. Henriques, você quer fazer assim umas torres tão grandes aqui no Funchal? Olhe que isso vai dar nas vistas. Está bem, diga que vão ser 25 pisos para a malta ficar assustada e depois mete um projeto com 10 pisos e ninguém vai notar. Mas, ó Sr. Presidente, isso também acho que não se enquadra no PDM. PDM?! Isso logo se vê. Faça, faça!’’.
‘’Ó Sr. Berardo, você quer demolir o Savoy e o Santa Isabel e construir esse batatão que está aí nessa maquete?! Mas olhe que o PDM dá-lhe menos capacidade construtiva que o que tem com os atuais hotéis! Vá lá, Sr. Presidente, olhe que isto vai dar muitos postos de trabalho. Mas olhe que isso vai dar nas vistas. Ó Sr. Presidente isto vai ficar um espetáculo como nunca se viu na Madeira. Bem, então temos que fazer-lhe um Plano de Urbanização à medida senão não lhe conseguimos aprovar um projeto com o dobro do índice de construção, o triplo do índice de implantação e mais 6 pisos do que está definido no PDM. E mesmo assim ainda vamos ter de suspender um ou outro artigo do PDM. Bem, logo se vê. Faça, faça’’.
‘’Ó Sr. Varino, um Dubai na Madeira? Olhe que nunca me tinha lembrado disso. Mas parece-me uma ideia fantástica. Mas olhe que, pelo desenho que trás aí, isso não encaixa no Plano de Urbanização do Amparo. O melhor é fazer um Plano de Pormenor porque nós também não temos a mínima ideia do que queremos para ali.

O Sr. Azevedo, o Sr. Henriques, o Sr. Berardo, os Srs. da Varino e tantos outros empreendedores e promotores imobiliários, não fizeram nada de mais. São empresários, jogam com as regras do jogo e tentam obter o máximo lucro do seu investimento. É certo que este ‘jogo’ do imobiliário, num território sem uma ideia do que quer ser, sem um rumo a longo prazo, com planos de urbanização feitos para acomodar obras já construídas ou apenas no papel, tem regras muito flexíveis e que vão mudando à vontade do freguês. É também verdade, que as empresas e os empresários têm uma responsabilidade social que devia refrear os seus instintos de pura especulação, contribuindo antes para a sustentabilidade do território onde investem.
Mas não é a eles que se deve apontar o dedo quando vimos assistindo, desde há décadas, à desqualificação da paisagem e à construção de património de duvidosa qualidade. Património que, na minha opinião, não deixará orgulhosas as gerações vindouras da obra dos seus antepassados.
Os responsáveis pela transformação do território e a defesa do interesse público para a construção de um património de qualidade e requalificação do existente, cabe apenas ao poder político e esse, continua a navegar à vista.
Se houvesse uma ideia clara do que se quer para a Madeira, uma ideia que compreendesse este território, a sua paisagem, a sua natureza, a sua escala, o seu encanto, jamais alguém se lembraria de colar duas imagens, uma da Madeira e outra do Dubai. Mas como na Madeira não se vislumbra um caminho claro de transformação da sua paisagem, rural ou urbana, … tudo é possível. Mesmo que o resultado, não tenha nada a ver com algum Dubai… felizmente.

Um dia destes aparecerá outro alguém que quererá fazer uma Macau do Atlântico na Madeira, com casinos e umas torres. As pessoas ficarão de boca aberta a olhar para uns desenhos de encher o olho e lá irão atrás dessa ou outra ideia brilhante.
Porque é que ainda ninguém se lembrou que bastaria fazer a Madeira na própria Madeira? Entretanto, vão-se perdendo oportunidades.
Até lá, bye bye Madeira

 

publicado do JM no dia 15 de Agosto de 2018

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