Série II.023
Dois voos picados e uma aterragem no Porto Santo
Voo 01
Revisão do Plano Diretor Municipal do Funchal.
No final do ano passado escrevi aqui um artigo que tratava de dois assuntos. Aí dei conta do despontar de um novo vetor para o desenvolvimento sustentável, que assim se junta ao económico, ao social e ao ambiental. O vetor da participação.
Transparência, clareza e participação da população, na construção do desígnio que se quer imprimir à coisa pública, são essenciais para o sucesso da sua implementação.
Dei também conta do processo de revisão do PDM de Lisboa, em que a transparência do processo esteve sempre patente desde o início, dois anos antes da sua aprovação e em que a participação da população foi essencial para afinar a estratégia definida pela Câmara. A participação verificou-se a vários níveis, desde diversas sessões com a população em cada junta de freguesia, a ‘test drives’ do Plano com atelieres de arquitetura, escritórios de advogados e quem quisesse participar porque, afinal, os ficheiros de cad editáveis do plano, estiveram disponíveis no site da Câmara durante o processo todo.
Ao contrário deste caminho, o PDM do Funchal surge agora para revisão, sem aviso prévio, com a participação pública resumida a 4 sessões de apresentação e sem uma verdadeira discussão sobre a nova estratégia para a cidade.
O processo da revisão que durou mais de 3 anos, não podia ter sido mais fechado sobre si mesmo, sem que se tivesse vislumbrado o que poderia ir para a discussão pública. A discussão pública, cumpre o prazo regulamentar, de pouco mais de um mês, apanhando Agosto pelo meio! Este processo tem-se revelado assim, a antítese dum processo transparente, claro e participado. Mais uma oportunidade perdida.
Voo 02
Barracada nas Selvagens
As ilhas Selvagens estendem o território português até ao paralelo 30. Não vive lá ninguém. É, contudo, uma reserva natural. Por isso é guardada por elementos do Parque Natural da Madeira para, assim, serem preservados os valores naturais e o equilíbrio ecológico daquele lugar.
Para acolher os guardas e os visitantes, ali foram sendo feitas algumas construções avulsas, sem preocupações arquitetónicas, de enquadramento paisagístico e que dignificassem a presença dos portugueses naquele território longínquo, também cobiçado pelos espanhóis.
O somatório das várias construções é pouco diferente do que vemos em bairros de génese ilegal. Porém, a certa altura, há cerca de dois anos, a Secretaria Regional do Ambiente, através do Parque Natural, organizou um concurso de ideias de arquitetura, em conjunto com a Ordem dos Arquitetos, para escolher a ideia e a equipa que desenvolveria dois projetos, um para cada uma das ilhas, com o objetivo de substituir aquele arraial de barracas que poluem o parque natural.
Mas a jovem equipa que venceu, rapidamente foi sendo posta de parte e o projeto esquecido.
Ao revés, construiu-se mais uma barraca para a Marinha e deu-se uma pintura para disfarçar, inaugurou-se a barracaria com ministro, secretária regional e tirou-se uma fotografia. Uma fotografia que, espero bem, não apareça na imprensa espanhola, pois seria certamente motivo de troça sobre a maneira como Portugal trata o seu parque natural mais antigo, com o estilo provisório/definitivo.
Voo 03
Aterragem no Porto Santo – o paraíso incompreendido
Tomara que os portosantenses valorizem os encantos da sua ilha e a possam encaminhar para se transformar num produto turístico diferente, ecológico, calmo, que contribua para a sua sustentabilidade e qualidade de vida das suas gentes.
15 de Agosto de 2017
publicado in JM . Jornal da Madeira