Durante anos a promoção turística da Madeira era feita com uma foto aérea sobre os hotéis Carlton, Savoy e Regency. Essa foto ilustrava bem qual tinha sido o modelo de turismo que a Madeira quis para desenvolver no seu território e dinamizar a economia, importando modelos do Sul de Espanha, de Canárias, que, só não resultaram em qualquer coisa parecida com a Quarteira no Algarve porque, apesar de tudo, a natureza desta ilha é de uma resiliência e beleza que vai disfarçando as cicatrizes que tem ganho.
Há cerca de uma década tentou-se mudar o cartaz. Nessa altura alguém inventou a ‘Madeira SPA’. E bem, porque esse cartaz tirava partido dos elementos que nos distinguem de outras paragens, oferecendo as vistas sobre a paisagem incólume da floresta laurisilva e outros lugares mais ou menos intocados. Porém, as ações políticas para o ordenamento do território e os projetos de obras que foram sendo aprovados, seguiam o modelo dos anos 70 e não o que, ao mesmo tempo se tentava ‘vender’ ao turista.
Agora, desde 2017, existe um novo Plano de Ordenamento Turístico, mas que julgo não construir ainda uma ideia clara daquilo para o qual todos devem trabalhar e investir.
Para isso começaria por fazer duas perguntas:
- A Madeira é um Lugar com um potencial turístico intrínseco? Ou seja, tem este arquipélago um carácter próprio para além das condições naturais e geográficas que confiram fatores de atratividade para potenciais visitantes?
- Deverão ser os locais turísticos um reflexo do mundo globalizado, importando arquétipos turísticos internacionais onde mal se distinga as características do Lugar; ou por outro lado, devem ser Lugares onde estejam presente os valores que conferem diferenciação, tais como os valores naturais, a História, as tradições e o modus vivendi da população local?
A minha resposta à primeira pergunta é que a Madeira tem condições geográficas, naturais e culturais singulares, que são interessantes para quem aqui vive e que detém um potencial atrativo para quem nos visita. Por isso não precisamos de inventar ambientes Disneyland, mini Las Vegas, ou materializar postais de outras paragens com coqueiros e areia amarela. A Madeira tem de ser a Madeira.
A resposta à segunda pergunta é que acredito mais num destino turístico que me ofereça mais do que um lugar ao sol, ao lado de uma piscina e de um gin tónico; que me ofereça um panorama cultural distinto e próprio do Lugar que vou visitar, que a sua paisagem natural e urbana seja preenchida por elementos que contenham tradição e contemporaneidade; que o património natural e arquitetónico sejam valorizados e não uma invenção para agradar o turista.
Partindo destes dois considerandos, há que repensar o modelo de desenvolvimento e ocupação do território, no sentido de cuidar daquilo que nos diferencia e potenciar os valores singulares que constituem o maior capital desta ilha.
Por isso há que partir de uma ideia que sirva de guia aos objetivos, às estratégias e às ações. A ideia, muito simples, é que a Madeira é um Lugar com uma História de 600 anos, uma paisagem singular, um clima invejável, uma posição geográfica cómoda para os visitantes e uma segurança que já vai sendo rara.
Tendo esta ideia sempre em mente, seria difícil descaracterizar os centros urbanos ou desqualificar a paisagem. Antes da aprovação da construção de obra pública ou privada, a pergunta que seria feita é se essa transformação do território cumpria a Ideia, se ajudava no objetivos e se se enquadrava nas estratégias definidas.
O planeamento serve para isso. Para saber se nos estamos desviando do rumo e é preciso corrigir a rota. Porque, para andar à deriva, sem saber para onde vamos, nem sequer é preciso marinheiros. Basta lançar um cabo a um rebocador e ficar à mercê da sua vontade levando-nos para onde ele quiser.
publicado do JM no dia 12 de Setembro de 2018